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Volta e meia estamos falando desse assunto, de como o preconceito contra a idade, contra pessoas mais velhas, está disseminado na sociedade, apesar de a população brasileira estar envelhecendo a passos largos, como mostrou o Censo de 2022.
E a pessoa nem precisa realmente ser mais velha para ser discriminada. Neste carnaval, vimos a linda Paolla Oliveira, 41 anos, ser considerada “velha”, apesar de perfeitamente em forma, para ser rainha da bateria de uma escola de samba.
As manifestações de etarismo estão por toda parte. O Estadão entrevistou Fran Winandy, 59 anos, mestre em Administração e pesquisadora na área de diversidade etária nas organizações, para discutir esse tipo de preconceito, que pode abalar tanto a autoestima das pessoas, especialmente das mulheres, principais vítimas.
Para a pesquisadora, qualquer preconceito pode ter efeito negativo para quem é a vítima. “Por isso”, receita ela, “é preciso ter amor próprio e não se deixar abater por essas questões.”
Leia:
Muito tem se falado sobre etarismo, tipo de discriminação que corresponde à discriminação por idade contra indivíduos ou grupos etários com base em estereótipos. Reproduzir esse discurso pode afetar negativamente a autoestima das pessoas, especialmente as mais idosas, levando-as ao isolamento e até à depressão, em casos mais graves.
Uma em cada duas pessoas pratica esse tipo de preconceito contra os mais velhos, segundo o Relatório Global sobre Etarismo, realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização das Nações Unidas (ONU), a partir do Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), em 2021.
De acordo com Fran Winandy, 59 anos, mestre em Administração e pesquisadora na área de diversidade etária nas organizações, a reflexão sobre o etarismo leva à sua desconstrução. Ela ressalta também a questão de gênero e a pressão imposta às mulheres, que faz com que elas sejam as mais afetadas pelo preconceito de idade.
Conforme a American Association of Retired Persons (AARP), quase duas em cada três mulheres com 50 ou mais anos dizem ser discriminadas regularmente, e essas experiências impactam na saúde mental delas. O dado é da pesquisa Mirror/Mirror de 2022, realizada nos Estados Unidos.
Paolla Oliveira dá show, mas é criticada:
Graduada em Psicologia, Fran atuou por muitos anos no setor de Recursos Humanos. Atualmente também é palestrante e consultora, contribuindo para tornar ambientes de trabalho mais diversos e inclusivos. Em entrevista ao Estadão, a pesquisadora explica a importância de a sociedade ter mais consciência sobre o etarismo e seu impacto.
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Por que a sociedade ainda reproduz esse preconceito contra as pessoas idosas? Como ele se manifesta?
O debate sobre o etarismo ainda está muito restrito ao universo acadêmico, no Brasil. Agora as pessoas estão começando a refletir mais sobre isso, mas ainda é um tema desconhecido por muitos. Esse preconceito sempre existiu, e ainda é muito presente dentro das empresas, por exemplo. Na área de Recursos Humanos, por exemplo, as normas de idade criam marcadores etários e dificultam a contratação de pessoas mais idosas.
Existem crenças de que pessoas acima dos 60 anos já não servem mais para desempenhar determinadas funções. Assim como acontece com os mais jovens, aqueles que estão ingressando no mercado de trabalho e possuem pouca experiência. Na prática, isso acontece, mas não aparece nas políticas das organizações. Mesmo assim, a inversão da pirâmide etária está fazendo com que as pessoas idosas vivam mais e convivam mais nesses ambientes. Isso ainda provoca estranhamento e discursos preconceituosos. E faz com que as pessoas tenham medo de parecerem velhas, sobretudo, e não somente o medo do envelhecimento.
Como essa discriminação afeta as mulheres? Pode-se dizer que esse preconceito as afeta mais?
O preconceito de idade atua de forma cruzada com outras discriminações, trata-se de uma questão de interseccionalidade. O etarismo impacta de modos diferentes pessoas com diferentes marcadores sociais. Uma mulher negra idosa sofre muito mais preconceito do que um homem branco com a mesma idade, por exemplo. O tópico do envelhecimento traz visibilidade para essas e outras questões.
Para as mulheres, que são pressionadas a vida inteira com a questão da idade, o envelhecimento é difícil. A mulher tem idade para namorar, para casar, para ter filhos. Isso tudo são imposições e estigmas que precisam ser quebrados. A sociedade é jovemcêntrica, só considera bom e bonito aquilo que jovem. A mulher madura também tem que lidar com a pressão dos padrões de beleza e o age shaming. Rugas e cabelos brancos tornam-se motivos de vergonha. O Brasil é campeão mundial em número de realizações de cirurgias plásticas, o que reforça esse caráter da sociedade.
Com o envelhecimento da população brasileira e o ingresso dessas pessoas no mercado de trabalho, você acredita que as pessoas vão passar a ter outro olhar para as gerações mais velhas? Ou essa discriminação será ainda mais comum?
Acredito que as pessoas vão passar a ter outro olhar. Na verdade, essa mudança já está acontecendo. Estamos falando mais sobre etarismo, e as empresas estão trabalhando mais esse pilar, principalmente as multinacionais, porque esse tema é mais disseminado fora do Brasil. Também temos a ascensão da geração Z, que é muito engajada em causas sociais e em questões de diversidade. Essas pessoas estão se envolvendo nesse debate. Então, a tendência é que esse preconceito diminua nos próximos anos.
Como podemos contornar o problema?
Penso que não vamos conseguir acabar com esse problema, mas podemos diminuir seu impacto. A conscientização é o primeiro ponto, porque ela leva à reflexão sobre o problema, a sociedade precisa se questionar mais sobre isso. As pessoas deveriam ouvir falar sobre isso desde pequenas, não somente em casa, mas também nas escolas. Essa discussão tem várias camadas, mas uma coisa é certa: se você nunca sofreu com esse preconceito, é muito provável que sofra em algum momento, tendo em vista o dado de que uma em cada duas pessoas reproduz esse discurso discriminatório. Todo mundo vai envelhecer.
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Aqueles que são mais jovens precisam atuar hoje para que, quando estiverem nesse lugar de envelhecimento, isso não seja um problema. Temos que acabar com os estereótipos negativos associados às pessoas idosas, essa é a raiz do etarismo. Achar que os mais velhos são teimosos, que têm dificuldade para aprender, que são desatualizados. A questão de considerar que os idosos não têm capacidade de lidar com a tecnologia é um grande problema nas empresas, por exemplo. Esse preconceito não tem lógica.
Que dicas você daria para alguém que sofre com esse preconceito?
Temos que levar uma mensagem de otimismo. Para que a pessoa não seja vítima do etarismo, ela não pode reproduzir os estigmas negativos relacionados ao envelhecimento. A sociedade espera que ela reproduza isso. É preciso que a pessoa se posicione e mostre que não é assim. Outra questão é manter a autoestima. Se a pessoa já não está com a saúde mental em dia, um comentário negativo relacionado à idade já pode ser um baque, levando algumas pessoas à depressão. Qualquer preconceito pode ter esse efeito. Por isso, é preciso ter amor próprio e não se deixar abater por essas questões.
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