Daniel Agrela
“Sou eu que vou seguir você / Do primeiro rabisco /Até o be-a-bá”. Assim diz o grande Toquinho na introdução de uma de suas mais belas composições, O Caderno. A cada estrofe, o músico ressalta de maneira poética a importância do caderno no desenvolvimento da criança e, por que não, dos adultos. Lançada em 1983, a canção foi, e ainda é, um grande sucesso. No entanto, a essência da letra, infelizmente, está perdendo seu sentido.
Se pararmos para observar o nosso próprio comportamento e das pessoas à nossa volta vamos perceber que o ato da escrita tradicional está cada vez mais escasso. Aquela, a mão, não se vê mais por aí. Não que o computador, antigamente fora a máquina de escrever, deva ser amaldiçoado. Não! Essas ferramentas são, basicamente, meios pelos quais usamos para formalizar uma ideia, um pensamento.
O caso é que muitas das pessoas que hoje escrevem em seus computadores, no passado, aprenderam as belezas do português em cadernos. A folha pautada com margem recebia redações, poemas, sínteses e cálculos. Se a letra não estivesse a contento, lá vinha a brochura especializada para treinar nossa caligrafia. Trabalho? Nada melhor do que o papel almaço. Apresentação? Cartolina. Nomes cada vez mais incomuns atualmente.
Para mim, o ato de escrever a mão sempre me ajudou a estudar. Não bastava apenas ler um texto. Antes de uma prova, copiava capítulos e mais capítulos dos livros do colégio no caderno, pois isso tinha um grande efeito de memorização e de entendimento da matéria. Outro detalhe: a preocupação de escrever corretamente, principalmente quando o uso da caneta era obrigatório, ajudava a assimilar a grafia correta das palavras. Hoje o cenário é outro.
Instrumento principal para a comunicação atualmente, o celular tem prestado um desserviço para a escrita. Dou um exemplo abaixo.
Ao escrever uma simples frase como “Olá, bom dia! Qual a sua programação para o fim de semana?” o aparelho, para facilitar a vida do usuário, oferece a solução de autocomplemento de texto. Ou seja, para formular a questão acima não é preciso digitar letra por letra. O aparelho, antecipadamente, entende o que você quer dizer e sugere rapidamente três opções de palavras. Com um toque na tela, escolhe-se a correta e voilà!
Pode parecer exagero, mas isso, aos poucos, nos afasta da forma clássica de relacionarmos com a língua. Por isso que, independente da evolução tecnológica, é fundamental que a escrita tradicional seja preservada na formação das crianças, dos jovens e também no dia a dia dos adultos. Nesse sentido, faço aqui um apelo em favor do caderno nas palavras de Toquinho: “Só peço, à você / Um favor, se puder / Não me esqueça /Num canto qualquer”.